quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Costeleta de Vitela (quase) como em Miranda

"o que indica que estamos perante um grelhado e não um assado é o facto de não haver entre o alimento grelhado e a fonte de calor, a introdução de novos sabores, gorduras, molhos, etc"

Foi assim que o Luís começou o post com que cumpriu a nonagésima oitava trilogia imposta a mim e à Ana e com os grelhados como tema.   

Gosto de pensar que tenho uma relação muito aberta e muito ignorante com o que se chama de cozinha ou gastronomia e com aquilo que cozinho. Isso dá-me margem para evoluir. Penso que repito muitos pratos e que devia ter mais cultura de restaurante, para saber o que outros fazem. Também penso que a minha cozinha simples e educada não está na moda, mas isso, curiosamente não me deprime.

O que me deprime é ver que o interesse das cozinhas caseiras e alimentadeiras das famílias anda muito à volta duma panela idiota, duma fritadeira mágica e dos ingredientes que chegam de todo o mundo ao supermercado com talões de desconto para o tonto fazer contas e pensar que poupou, sem saber que o que alegadamente poupou vai ser reposto pelo produtor.

Ainda assim, terei que dizer que o cartão do continente me permite um bónus de € 250,00 de compras por cada € 25.000,00 que gastar, o que é um pouco mais porreiro do que o governo me permite abater no IRS, se andar a guardar as facturas de restaurantes, cabeleireiro e oficina (tenho que gastar uns vinte e sete mil euros e guardar as facturas uns bons anos para ter direito aos mesmos € 250,00 - quem é amigo, quem é?).

Na minha humilde cozinha urbana que não me permite ter um simples fogareiro a carvão, se quiser ensaiar um dos belos pratos da nossa cozinha tradicional, tenho mesmo que permitir troca de sabores entre o alimento e a fonte de calor, mas não será muito diferente do modo tradicional (não confundir este tradicional com o que se usa adaptado à bimby, pf). Ensaiei de novo um naco de carne mirandesa.

Começa-se por meter batatas a assar, pequenas e novas, na cloche, demoram cerca de meia hora e só precisam de sal.

Um fio de azeite na frigideira a aquecer e estando bem quente, junte-se-lhe uma costeleta de vitela. Deixa-se um pouco menos de um minuto e vira-se.  


Tempera-se a parte superior com sal e mistura de pimentas e deixa-se outro quase minuto. Volta a virar-se e tempera-se do outro lado. Baixa-se o lume e deixa-se o tempo necessário para ficar a gosto (em sangue, mal passada ou sola de sapato, já que mesmo a melhor carne tem limites de paciência).


Tira-se a costeleta da frigideira e reserva-se. Entretanto, volta a subir-se o lume e juntam-se uns dentes de alho esmagados com a faca, deixam-se estalar e abafa-se tudo com um pouco de vinho branco. Deixa-se uns minutos em lume médio. Para servir, tiram-se as batatas da cloche, esmagam-se com um murro e temperam-se com alho esmagado e bom azeite. Serve-se assim, as batatas com o azeite e o alho e a carne com o molho dela. Querendo, juntem-se grelos escalfados e salteados com azeite e alho. 


Este é um prato de sustância e que pede um vinho com alguma estrutura. A escolha normal é um bom tinto, como gosto, mas neste fim de verão, quente, escolhi um vinho branco que se portou muito bem. 

Encruzado 2010 da Casa Aranda. É um vinho rebelde que o António Narciso não parece ter querido domar. Muito álcool (14º), pouca fruta são epítetos que se lhe podem aplicar, mas isso seria ser muito redutor. Este é um vinho quase sem assinatura do enólogo. Aparentemente, fez e bem o que as uvas deram, sem truques. Um belo branco do Dão com estrutura para acompanhar este prato.



2 comentários:

  1. Gostei muito da tua introdução e, deixa-me que te diga que, para mim, as cozinhas não se medem pela complicação e muito menos pelo rigor com que "papagueiam" receitas, novas ou velhas, mas sim pela simplicidade com que tratam o tradicional ou o moderno, reinventando-o naquilo que um prato deve sempre ser: apreciado e gozado, não por quem o inventou há cem anos, mas por quem o vai agora comer.
    Da tua cozinha transparece esse cuidado, que às vezes se pode pensar preciosismo, mas que reflecte uma cozinha feita por ti e para ti e que tenho a certeza que não te desilude, nem a nós ao lê-la e por vezes a segui-la.
    Salivei com essa costeleta/posta, que eu teria feito quase igual, excepto no azeite, que no meu caso ficaria na garrafa e usaria como gordura aquela barrinha que ladeava a carne, previamente derretida na frigideira.
    Bela Trilogia!

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  2. Chama-lhe aberta, ignorante, evolutiva,inculta, simples, educada... anti depressiva... que eu gosto e sigo na mesma.
    (É claro que não vou falar das batatinhas - são como sempre as melhores do planeta e arredores).
    Beijinhos.

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